Parece-me mais fácil ter fé em Deus, não obstante ser algo tão para
além da nossa limitadíssima compreensão, do que na arrogante
humanidade. Durante muitos anos, afirmei-me crente por pura
preguiça. Ser-me-ia difícil explicar a Odete, a todos os outros,
a minha descrença. Também não acreditava nos homens, mas isso as
pessoas aceitam com facilidade. Compreendi ao longo dos últimos
anos que, para acreditar em Deus, é forçoso confiar na humanidade.
Não existe Deus sem humanidade.
Continuo a não acreditar, nem em Deus, nem na humanidade.
Desde que Fantasma morreu cultuo o espírito d´Ele. Converso com
Ele. Julgo que me escuta. Acredito nisso não por um esforço
da imaginação, muito menos da inteligência, mas por empenho
de uma outra faculdade, a que podemos chamar desrazão.
Converso comigo mesma?
Pode ser. Como, aliás os santos, aqueles que se vangloriavam de
conversar com Deus. Eu sou menos arrogante. Converso comigo,
julgando conversar com a alma doce de um cão. Em todo o caso são
conversas que me fazem bem.
Ludovica Fernandes Mano em Teoria Geral do Esquecimento
de José Eduardo Agualusa
de José Eduardo Agualusa
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