para um angolano que tenha apenas passaporte normal (entenda-se ordinário), os planos para uma viagem de turismo começam sempre com a seguinte afirmação: preciso de visto! conheço algumas pessoas que por esse facto tentam o máximo fugir para destinos onde não será necessário passar pela batalha do pedido de um visto... mas infelizmente, os destinos que lhes são oferecidos não são muitos e alguns até são esquisitos.
para esses angolanos ordinários, ir a uma embaixada requisitar um visto é quase sempre um momento de espera, um momento humilhante, um momento de vergonha, um momento de duvidas e outras coisas mais.
um momento de espera para aqueles que não se preparam mental e fisicamente para a espera, para os impacientes ou até para alguns arrogantes que acham que em território estrangeiro podem comportar-se igualmente como o fazem em território nacional.
um momento humilhante que começa nas filas que se iniciam pela madrugada porque no final só serão atendidas 10 pessoas! por mais descontraídas que as pessoas estejam, a visão que temos daquele aglomerado de gente no momento em que se escuta o som da abertura das portas do consulado, é uma mistura facial do sentimento de alivio, alegria, revolta, tristeza, medo e muitas mais coisas impossíveis de se captar através da objectiva de uma simples máquina fotográfica.
um momento de vergonha porque em muitos casos a desorganização naquele aglomerado de pessoas começa nelas próprias, talvez por estarem habituados a viverem com a desorganização e a falta de respeito. só assim se explica que a maioria não respeita a ordem de chegada e parte sempre para o lado do esquema para aos pouco se posicionar no topo da fila. extraordinariamente, muitas dessas pessoas são as primeiras a exigir respeito do pessoal do consulado que se encontra do outro lado do vidro duplo, porque, segundo eles sentem-se humilhados, sem nunca se lembrarem daquelas pessoas que humilhantemente perderam o lugar por causa do seu esquema!
um momento de duvida porque é quase impossível não questionar-se se realmente é necessário passar-se por tudo isso!?
mas depois, chega-se em casa e abre-se um livro ou uma revista e se encontra um texto que nos faz repensar sobre as palavras acima escritas. estaremos enganados ou seremos nós próprios também arrogantes?
Espera
Esperar por alguém é uma forma de apurar o futuro encontro (futuro próximo, esperamos nós). no fundo, aquele é um tempo suplementar que quem se atrasa nos dá para que possamos afinar o nosso bom-dia que, por vezes, como se sabe, sai tão desajustado, tão desequilibrado. Os melhores bons-dias são ditos – diria eu – por quem sabe esperar; isto é, por quem utiliza bem o tempo de espera.
Podemos então assumir que, se alguém te faz esperar é porque ainda não estavas preparado para agir – e esta é uma delicada interpretação (há outras) da dessincronização entre dois humanos. O que se deve fazer enquanto se espera? É uma pergunta sensata. A sensata resposta é, de imediato: nunca fazer outra coisa. Se é para esperar, esperamos – não lemos, não vemos televisão, não abrimos o computador, não telefonamos – esperamos; apenas. Se quem espera está a fazer outra coisa então não está verdadeiramente a esperar – está a fazer outra coisa. Pois, portanto, esperamos.
Esperar é, assim, um verbo, uma acção, actividade, é uma coisa que tem de ser feita – não é um vazio que tem de ser preenchido com outra tarefa. Esperar é a tarefa. É a tarefa. É a tarefa de quem espera.
A arte de esperar eis, portanto, o que me parece urgente desenvolver. Há pessoas que sabem esperar, há pessoas que não sabem esperar. e a forma de aprender a Grande Espera é começar a treinar a pequena Espera (esperar por alguém no café; esperar pela nossa vez para sermos atendido, etc.).
O que é a Grande Espera? É esperar pela morte. Estar vivo em parte é isto (é também muitas outras coisas, claro): é saber o que fazer enquanto se está por completo na Grande Espera. Há pessoas que sabem esperar a Grande Espera, há pessoas que não.
A questão é: será a pequena espera (a espera por alguém que combinou estar às seis da tarde e já são seis e vinte e ainda apareceu) um treino para a Outra? Talvez sim, talvez não.
De qualquer maneira, a arte de espera não é uma brincadeira. E assunto bem serio, caro mortal.
«A espera
Para o índio
É meia dança»
(Charles Tomlinson)
2 comentários:
Oras mais é assim que gosto de textos, simples, objetivo, com um desenrolar magnífico e bem explicativo. Esperar é uma arte, que todos nós aprendemos com a vida, e uma grande virtude! Infelizmente não são todos que consegue desenvolver essa capacidade,por vezes se espera um vida toda e tal virtude não se alcança. Belo texto.
:)
esperar é um propósito.
só espera quem se propôs a isso, não creio que seja arte.
;)
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