quarta-feira, janeiro 23, 2008
Atonement/Expiação*
Querida Cecilia.
A história pode continuar.
A que eu tinha planeado
para a caminhada daquela noite.
Posso voltar a ser o homem que uma vez
atravessou o parque Surrey ao anoitecer,
no meu melhor fato,
pavoneando-me com a promessa de vida.
O homem que, com a clareza da paixão,
fez amor contigo na biblioteca.
A história pode continuar.
Eu voltarei,
encontrar-te-ei, amar-te-ei,
casarei contigo.
E viverei sem vergonha.
Sim, completamente. Não mudei
quaisquer nomes, incluindo o meu.
E foi esse o problema?
Não.
Decidi, há muito tempo,
contar a verdade absoluta.
Sem rimas, sem embelezamentos.
E acho que...
Se ler o livro, vai perceber porque.
Tive testemunhos em primeira mão de todos
os acontecimentos que não presenciei,
as condições na prisão,
a evacuação para Dunquerque, tudo.
Mas o efeito de toda esta
honestidade foi bastante impiedoso.
Percebe, não conseguia imaginar
que propósito ela serviria.
Pelo que? Desculpe.
Servido pela honestidade?
Pela honestidade.
Ou pela realidade.
Porque, de facto,
fui cobarde demais para ir visitar
a minha irmã em Junho de 1940.
Nunca fiz aquela viagem até Balham.
Portanto, a cena em que me
confesso a eles é imaginária.
Inventada.
E, de facto,
nunca poderia ter acontecido.
Porque...
Robbie Turner morreu
de septicemia em Bray-Dunes
no dia 1 de Junho de 1940,
no ultimo dia da evacuação.
E eu nunca fui capaz de compor
as coisas com a minha irmã, Cecilia,
pois ela foi morta
em 15 de Outubro de 1940,
pela bomba que destruiu
as condutas de água e de gás
por cima da estação de Metro de Balham.
Portanto...
A minha irmã e o Robbie
nunca tiveram o tempo juntos
que tanto ansiavam e mereciam.
E o qual, desde então, eu...
Desde então sempre senti
que fui eu que o evitei.
Mas que sensação de esperança,
ou satisfação, poderia um
leitor retirar de um final assim?
Por isso, no livro, eu quis dar a
Robbie e Cecilia o que perderam na vida.
Gosto de pensar que isto
não é fraqueza ou fuga,
mas um acto final de bondade.
Dei-lhes a sua felicidade.
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